26 de janeiro de 2008

Simplesmente Cinema Recomenda

ASSÉDIO
(Besieged, 1998)
de Bernardo Bertolucci

Assédio nos traz um Bertolucci especialmente inspirado e em sua melhor forma. Elegante nos sentidos, conciso em palavras, rico em cores e magistral em concepção, o filme atinge um nível de perfeição raro no cinema autoral contemporâneo. Sua câmera e sua edição nos surpreendem a cada tomada e a cada corte. O encadeamento das cenas é como um rico bordado alinhavado com cores, sons, objetos e texturas.

O filme pode ser visto como a radiografia do crescimento de um amor. Adicionalmente, e por não se conformar com apenas isso, Bertolucci introduz alguns toques sócio-políticos, ao abordar a difícil situação de algumas comunidades africanas.

Com extrema sensibilidade, ele procura, com sua conhecida maestria, usar a música, o corpo, a troca de olhares, ao invés do diálogo, para passar sua mensagem ao espectador. Composições clássicas de Mozart e Bach se conjugam com o inspirado sax de John Coltrane e com uma seleção de ritmos africanos.

Além da magnífica direção de câmera e da fantástica seleção de músicas, "Assédio" conta ainda com um ótimo roteiro, escrito por Bertolucci e por sua mulher, Clare Peploe, com o competente design de produção de Gianni Silvestri, com a bela fotografia de Fabio Cianchetti e com as grandes atuações de David Thewlis e Thandie Newton.

Assédio vai elaborar todo um discurso a respeito das novas formas de viver, de pensar, as novas modalidades de trabalho, de vínculo social. O filme sinaliza para outros modos de sociabilidade num mundo de populações, imagens e culturas migrantes. Segundo Bertolucci, a idéia era “trabalhar uma dramaturgia sem conflito”.

A impossibilidade do diálogo é central aqui. Um dos únicos momentos em que uma troca de palavras acontece, ao invés de aproximar à africana e o inglês, gera, ao contrário, ódio e indignação. Ele diz, em inglês: “Eu amo você. Vou com você para qualquer lugar. Se você quiser, nós podemos ir à África.” E ela responde, em inglês, empurrando-o para longe: “África? Mas o que você sabe sobre a África?”

No geral trata-se de um filme delicado, contraditório (o que faz dele tão belo) à situação que vai decorrendo;pois há um peso vital que o desejo, o afeto, o querer, o sexo, se fere ao defrontar a história por valores e pré-conceitos quase como que um fantasma imenso e pesado a atormentar vontades, talvez apenas perceptível quando encostado ao amor, porem invisível aos nossos próprios olhos mesmo que sempre invocado por nós mesmos. O filme é intrigante, doce e doloroso...


... Cuspido por Raphael, e informações adicionais IMDB e CINEPT.

LUZ , CÂMERA , AÇÃO ...CORTA.

19 de janeiro de 2008

Simplesmente Cinema Recomenda

ENTRE O CÉU E O INFERNO
(
Black Snake Moan, 2006)
de Craig Brewer

“Blues de alma, mas rock 'n' roll em atitude, “Black Snake Moan” parece a princípio mais um exemplar de cinema conservador raivoso travestido de filme “pulp”, mas vai além numa cena espetacular”. Bernardo Krivochein.

A história no começo pode soar mais uma obra caricata mergulhada em apelação, mas o diretor e roteirista Craig Brewer (de "Ritmo de Um Sonho") trata de dar à trama sensibilidade, e por mais que risadas de canto de boca possam surgir quando Ricci "devora" os homens, o expectador acaba se sensibilizando com a situação da personagem.

O leque de personagens principais é fabuloso. Samuel L. Jackson vive o pós-trauma do término de um casamento de vários anos, isolado na sua quinta, refugiando-se no álcool e nos blues que outrora faziam dele um homem de significado cultural no seu meio. Christina Ricci com uma espantosa representação tem uma de suas mais ousadas performances. Ela é uma jovem que vê o namorado partir para uma experiência militar e assim se vê privada de todo o conforto emocional que este lhe transmite, regressando a um passado bem presente de distúrbios psicológicos.


“Absorver-nos nessa cultura tão distinta, mas, simultaneamente, tão universal - A cultura do amor - Que não tem margens. Nem nome”. Craig Brewer

E, em “Black Snake Moan”, Brewer arquiteta uma história que nos vai atribuindo, a pouco e pouco, os detalhes que precisamos para a compreender e apreciar. É um filme atípico, com a alma de uma boa canção de blues e que questiona a força do amor. E aborda a necessidade de relações humanas, a necessidade de tranquilidade interior e a necessidade de afirmação em determinado meio. Porque o termo “meio” pode ser mais circunscrito do que se pretende.

“Black Snake Moan” mostra a que veio numa cena espetacular que explode na tela e revela a verdadeira ambição do longa: incapaz de pregar os olhos à noite, Lazarus decide dar mais uma chance a sua guitarra de blues e leva Rae, quase completamente reformada, para o bar que ele freqüenta há sabe-se lá quantas décadas. Lazarus costumava tocar lá, suas performances históricas tendo permanecido só na saudade da comunidade boêmia local por muito tempo. A notícia do retorno de Lazarus ao palco do bar provoca comoção geral: ao contrário de todas as noites, o lugar está lotado. Lazarus e banda começam a tocar e Rae, assim como todos os freqüentadores, dançam como se possuídos. É uma dança sugestiva, erótica, de fazer os conservadores ficar de cabelo em pé. É uma “Dança da Garrafa” ou a coreografia da “Injeção”. Mas Brewer faz desse momento, senão o mais puro, o mais catártico em todo o filme.

"Black Snake Moan" tem vários paralelos com o blues. É uma obra sobre redenção, espiritualidade e amor, em que as pessoas precisam espantar seus "demônios" ou simplesmente seguir em frente e conviver com eles.

Destaque para a trilha sonora, repleta de belas canções de blues.



Trilha sonora:

1 - When The Lights Go Out Escrita por Daniel Q. Auerbach & Patrick J. Carney.Interpretada por The Black Keys.
2 - Lord Have Mercy On me Escrita por Junior Kimbrough.Interpretada por Outrageous Cherry.

3 - Standing In My Doorway Crying Escrita e Interpretada por Jessie Mae Hemphill.
4 - Pass And FailEscrita por Erika
Wennerstrom.Interpretada por The Heartless Bastards.
5 - Mr. Oblivian Escrita por Michael Paul Walker.Interpretada por Eldorado and the Ruckus.
6 - The Losing Kind Escrita e Interpretada por John Doe.
7 - Just Like A Bird Without A Feather Escrita por R.L. Burnside.Interpretada por Samuel L. Jackson e Kenny Brown.
8 - Hate On Escrita por Al Kapone e John Shaw.Interpretada por Al Kapone.

9 - Morning Train Interpretada por Precious Bryant.
10 - Chicken Heads Escrita por Bobby Rush e Calvin Carter.Interpretada por Bobby Rush.
11 - Catfish Blues Escrita por Robert Petway.Interpretada por Samuel L. Jackson.
12 - Jack's Blues Escrita e Interpretada por Big Jack Johnson.
13 - Catfish Medley Interpretada por Samuel L. Jackson e Big Jack Johnson.

14 - Jesus On The Mainline Interpretada por Tate County Singers.
15 - Granny, Do Your Dog Bite? Escrita por Otha Turner.Interpretada por Otha Turner e The Rising Star Fire & Drum Band.
16 - Lonesome In My Home Escrita e Interpretada por Junior Kimbrough.
17 - A Town With No Shame Escrita e Interpretada por Jimbo Mathus.
18 - Old Black Mattie Escrita e Interpretada por R.L. Burnside.
19 - All I Need Is Some Sunshine In My LifeEscrita por W. Dean Parker.Interpretada por The Dixie Nightingales.
20 - Black Snake Moan Interpretada por Samuel L. Jackson and Jason Freeman.
21 - Balm In Gilead Interpretada por S. Epatha Merkerson.
22 - My Baby Got Drunk Escrita e Interpretada por Paul "Wine" Jones.
23 - Alice Mae Escrita por R.L. Burnside e Kenny Brown.Interpretada por Samuel L. Jackson, Kenny Brown e Cedric Burnside.
24 - Stackolee Interpretada por Samuel L. Jackson, Kenny Brown, Luther Dickinson e Cedric Burnside.
25 - This Little Light Of Mine Interpretada por Christina Ricci e Alvin Youngblood Hart.
26 - Mean Ol' Wind Died Down Escrita por Luther Dickinson.Interpretada por North Mississippi Allstars.

Cuspido por ...Raphael & informações adicionais IMDB e List Music.

LUZ , CÂMERA , AÇÃO ...CORTA.