5 de julho de 2008

Simplesmente Cinema Recomenda

Donnie Darko
(2001)
de Richard Kelly

No horizonte surge o Sol, brilhando sobre as árvores frondosas pinceladas com gotas de orvalho. Prostrado no alcatrão de uma estrada embutida na montanha, jaz um corpo inanimado junto a uma bicicleta derrubada. Acidente? Morte? Qual a ocorrência? De repente, o corpo manifesta movimento e é revelada a silhueta de um adolescente erguendo-se lentamente. Ele contempla o horizonte, monta na sua bicicleta e pedala pela estrada abaixo. Este é apenas mais um amanhecer, na vida bizarra de Donnie Darko.

Donnie Darko (2001) é um filme ambíguo e complexo. O argumento parece demasiado confuso , pois preocupa-se mais em colocar questões fascinantes do que fornecer respostas claras . Isto faz da obra de estréia de Richard Kelly uma raridade em Hollywood, já que os guionistas americanos prezam muito pelos enredos claros, coerentes e bem ordenados. Porém, tudo em Donnie Darko tem uma explicação. Na verdade, este filme sobre viagens no tempo é uma espécie de quebra-cabeças gigante. As soluções estão lá todas escondidas como ovos de Páscoa, mas é preciso saber procurar nos sítios certos.

A referência à Breve História do Tempo, de Stephen Hawking, é uma pista importante.

Hawking admite mesmo que haja pontes ou atalhos, chamados buracos de verme, para chegar às regiões mais distantes do espaço-tempo. Ao regressarmos ao passado através de uma dessas pontes, estaríamos a criar um universo alternativo e faríamos com que o tempo fluísse em dois cursos paralelos.

Como conseguiu Donnie Darko voltar ao passado? O livro A Filosofia das Viagens no Tempo dá-nos a resposta: tudo decorre num Universo Tangente em que o nosso protagonista foi escolhido como Receptor para devolver um Artefato ao Universo Primário. Ora, o Receptor Vivo é muitas vezes abençoado com poderes sobrenaturais, que incluem força acrescida, telepatia e a habilidade de manipular o fogo e a água. Isto explica que Donnie tenha conseguido inundar a escola, incendiar a casa e enfiar o machado na estátua de bronze.

As ações de Donnie Darko são guiadas por Frank, o misterioso Coelhinho Gigante. Todo o esforço do realizador Richard Kelly parece indiciar que o Coelho é uma personagem maléfica: a voz distorcida, os atos de destruição (o incêndio e a inundação) que ele desencadeia. Porém, Frank não tem nada de maligno. Ele é, na verdade, um mensageiro regressado do futuro e a sua intenção são auxiliar Donnie a resgatar a Humanidade da destruição pelo Universo Tangente.

Frank não está só, pois todos os outros habitantes da cidade também auxiliam o protagonista. Eles são os chamados Manipulados Vivos e fornecem continuamente pistas para a solução do mistério: a professora de inglês refere a expressão Cellar Door, que conduzirá o protagonista à casa da Avó Morte; a partida da mãe permite a realização da fatídica festa de bruxas;. No final, todos eles sobreviverão e estarão reunidos na magnífica seqüência ao som da canção Mad World.

Resta saber quem é o grande responsável pela manipulação de todas estas personagens. Uma possibilidade é que ela tenha partido de uma civilização mais evoluída que a nossa: os sonhos de Donnie mostram-nos uma cidade do futuro inundada em água e o próprio Stephen Hawking escreveu que uma tecnologia avançada poderia utilizar com sucesso os buracos de verme. Outra possibilidade é a intervenção divina, que também é sugerida pelo filme. Esta solução tem conseqüências teológicas: Deus não seria um Grande Relojoeiro que dá corda ao mundo e se afasta para nunca mais intervir, mas é, pelo contrário, um criador que pode mudar de idéias e atuar no seu Universo através de milagres.

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10 de março de 2008

Caminhos do paraíso


Os dias do paraíso que vemos são os dias da terra. Uma terra-mãe que dá a vida e a morte e onde o amor acontece, ele que também dá vida e que também dá morte. No cinema de Terrence Malick a natureza tem um papel determinante e “Days of Heaven” (1978), sua segundo longa-metragem, não é excepção. O olhar fixa-se nas envolvências, admira-se com o meio. Não é por acaso que o filme é narrado por uma criança, que nos põe a par do seu espanto pela existência que vai conhecendo e desconhecendo um pouco mais todos os dias. Há sempre uma pureza nos cenários que Malick nos mostra, uma pureza sempre condenada. O filme segue o trajecto de um casal de amantes.

No início partem de Chicago para buscar trabalho sazonal numa quinta texana. Lá fazem-se passar por irmãos e o dono da terra, um jovem com os dias contados, deixa-se apaixonar por ela, acabando por a desposar. Mas o amante-irmão está sempre presente e os momentos de felicidade são efémeros. No final há morte mas até a morte é vida. É só uma outra partida. As personagens não têm assim tanto relevo enquanto indivíduos. O filme termina e já nem nos lembramos do nome que tinham.
Há algo de religioso neste filme, e não é somente o título. E há algo que nos traz à memória de Murnau, nomeadamente o Murnau de “City Girl” (1930).

Mas há um olhar que é só de Malick, que se fascina com o belo natural como ninguém. A beleza da luz e das sombras num crepúsculo ou numa noite, os movimentos de um rio, o branco da neve, até os insectos praga. À bela música criada por Ennio Morricone juntam-se os sons da própria natureza. Tudo se une, o artificial que sempre existe no cinema e a evidência do natural. Juntos são uma nova dimensão, uma dimensão
malickiana, um sopro do vento que faz agitar as searas e as águas, que sentimos real mesmo que seja só no ecrã. As imagens são versos que nos maravilham. Pois se existe poesia em forma de cinema ela é a obra de Terrence Malick.

2 de março de 2008

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O Anjo Exterminador
(El Ángel Exterminador, 1962)
de
Luis Bunuel

"A moral burguesa é, para mim, uma imoralidade contra a qual há de se lutar; esta moral que se baseia em nossas instituições sociais mais injustas como o são a religião, a pátria, a família e a cultura, em suma, o que se denomina os pilares da sociedade." Luis Buñuel

O retrato da burguesia de Buñuel é o mais vil e cruel, desumana e imoral faceta da sociedade: hipocrisia, o adultério, a vaidade, a desconsideração ao próximo, os maldizeres, a imoralidade (a qual é tratada com a maior naturalidade e complacência), e inevitável ironia sórdida. Além de uma sutil, mas não menos expressiva crítica à igreja.


Sem grandes arroubos técnicos, contando a história de forma bem simples, Buñuel faz uma voraz critica, muito expressiva, sobre a burguesia e suas “capas douradas” – que hoje pode ser estendida a todas as classes sociais.


Buñuel sabiamente despe a sociedade aristocrata, a qual se vê presa numa das salas de uma mansão após um jantar formal. Não há nada que os impeça de sair, porém o formalismo e a convenção os fazem refém de portas e grades imaginárias.
Com o decorrer dos dias, as convenções vão caindo, porém as barreiras imaginárias permanecem, momento no qual as mascaras desprendem-se de cada personagem, aforando os mais primitivos instintos.

Porém, como tudo isso seria possível? Como dito antes, os convidados são tomados de tal crise de abulia, talvez uma elevação do grau de passividade já retratado naquelas pessoas - em determinado momento, o médico presente compara o fato de se morrer ao termo "ficar completamente calmo" -. Ao se aproximarem da passagem para outro ambiente da residência, as pessoas sempre acabavam encontrando uma desculpa para evitar a continuação do movimento e, caso insistissem, ficariam prostradas, as forças esgotadas, impedindo os membros de se mexerem.

Ao contrário de Lynch (cujo trabalho de Buñuel foi uma óbvia fonte de inspiração), o realizador espanhol utiliza o silêncio para criar inquietação e desconforto, tanto psicológico como físico, ganhando com isto um maior realismo. Também ao contrário de Lynch, Buñuel utiliza uma estrutura narrativa mais linear e perceptível, em que destaca os diálogos em espanhol com grandes cargas de ironia, muitas vezes pouco perceptíveis quando sujeitos a tradução.

O Anjo Exterminador é, por fim, daqueles filmes para serem vistos e revistos. Preste atenção nos detalhes. O anjo e Buñuel têm sempre algo a dizer.

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16 de fevereiro de 2008

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AMNÉSIA
(Memento, 2000)
de
Christopher Nolan


"Memento" é refinado quebra-cabeça que exige memória e concentração do espectador.
Fernanda Russomano (Londres)

Memento é um filme do tipo conceitual. Daqueles que se prendem a uma idéia de roteiro e constroem toda a obra em torno e dependentemente dessa característica.

Com um enredo extremamente bem amarrado, o filme conta a história de Leonard Shelby, belissimamente interpretado por Guy Pearce, que sofre de perda parcial de memória devido a uma pancada que levou na cabeça do criminoso que estuprou e matou a sua esposa. Ele está a procura deste assassino que arruinou a sua vida. Como não consegue lembrar de nada por mais de alguns minutos, Leonard faz anotações de tudo o que vê, ouve e até das coisas mais rotineiras, como fazer a barba. Sua memória é registrada em fotos Polaroid e as mais cruciais são tatuadas em seu corpo, muitas vezes por ele mesmo.Durante esta desesperada busca, ele conhece o ambíguo Teddy (Joe Pantoliano), e a "barwoman" Natalie (Carrie-Anne Moss).

É verdade que "Memento" sofre do vício daqueles filmes em que as personagens (e, com elas, o espectador...) sabem de menos — é que nesses casos, o realizador sabe demais, e é difícil resistir à tentação do jogo e da manipulação.

O ritmo rápido das cenas em preto e branco torna "Memento" ainda mais intrigante e nos obriga a exercitar a nossa memória. Mostram o passado de Leonard antes do incidente e também são peças essenciais para a montagem deste filme "quebra-cabeça". "Memento" exige uma grande concentração.

O que falar da trilha sonora, que é muito bem utilizada, aparece nos momentos certos e é extremamente envolvente. E, principalmente, é preciosa na construção do ambiente depressivo que Christopher Nolan nos apresenta. E ajuda-nos a perceber que o filme, mais que um thriller, é um genial drama existencial.

As imagens que Cristopher Nolan nos oferece, em Memento, fazem lembrar as notas de uma qualquer melodia que não reconhecemos de imediato, quando a sua composição é ligeiramente alterada. Com o encadeamento inteligente e sedutor de ideias, a coerência entre a mente do espectador e o declarado desfile de epicentros psicológicos presente, podemos afirmar que, a Memento, só falta mesmo o que dele podemos sentir.

E é esse o desafio que nos é colocado. Sabemos o que aconteceu (o início do filme dá-nos a conhecer como termina), e não o que vai acontecer. Como se contemplássemos a perfeição e o jogo de cores presente na pintura de um quadro, não perdendo depois o entusiasmo, ao tentar perceber os motivos físicos e emocionais que levaram o pintor a criá-lo.

Memento torna-se, nesse sentido, num dos trabalhos mais estimulantes sobre a capacidade e o significado da memória de um ser humano e da rotina desse pensamento.

Nós, enquanto indivíduos, podemos decidir “esquecer” algo que não nos agrada, algo com que não nos queremos confrontar. O início e final de “Memento” são, por isso, particularmente chocantes, não tanto no que mostram, mas pela forma como questionam e jogam com as nossas certezas e, principalmente, pela forma como constatamos, em toda a sua dimensão, o destino cruel da personagem principal. No fundo, a ambíguidade de acreditar naquilo que queremos… Hitler também pensou o mesmo, com os resultados que se conhecem. A existência do anjo da morte loiro que Pearce encarna com tanta bravura não anda muito longe…

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10 de fevereiro de 2008

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SENTENÇA DE MORTE
(Death Sentence, 2007)

de James Wan

O tema não é novo. Família que vive em perfeita harmonia transforma cada momento especial num pedaço de “eternidade” com gravações e mais gravações dos principais eventos comemorados juntos. Até que um dia, o filho mais velho é assassinado em frente ao pai que consegue reconhecer o assassino. Começa então uma guerra particular entre o pai atormentado e a gangue. Tudo acompanhado de perto pelo sistema falho de justiça e por policiais coniventes.

O filme realmente mostra o que acontece com quem tenta fazer a justiça com as próprias mãos. Entendo que o personagem de Nick fique louco ao saber que seu filho não foi morto por “acidente” em um assalto, mas sim determinadamente escolhido para a iniciação em uma gangue de um moleque chamado Joe.

O fato é que Nick parte mesmo para a vingança e consegue comer o seu prato ainda quente. Mas, claro, desencadeia uma reação das grandes de Billy e de sua gangue - formada ainda por Bodie (Edi Gathegi), Heco (Hector Atreyu Ruiz), Baggy (Kanin J. Howell) Jamie (Dennis Keiffer), Tommy (Freddy Bouciegues), entre outros. A reação do grupo rende algumas cenas de perseguição ótimas, além de uma inevitável represália para o restante da família de Nick.

O diretor ainda acertou em cheio ao escolher Kevin Bacon para o papel do pai que passa por três grandes transformações durante o filme, de pai boa praça, passando pela fase de atormentação com a morte do filho e terminando como um animal tão violento quanto seus inimigos. Sua performance supera seu belíssimo trabalho em O Lenhador (2004). A sumida Kelly Preston (Sky High) não compromete sua participação como a mãe de família. Mas são dois coadjuvantes que dão um show quando aparecem em cena. John Goodman (A Volta do Todo Poderoso) rouba toda as suas cenas como um vendedor de armas duro na queda. Garret Hedlund (Eragon e sobrinho de Brad Pitt em Tróia) se despe de sua beleza épica para interpretar o líder da gangue e não desaponta.

A direção de James Wan é bem equilibrada, com o tom exato conforme a situação e com espaço para alguns momentos mais de expressão dos personagens. A história é baseada no livro de Brian Garfield, com roteiro assinado por Ian Jeffers.

O que poderia ser um drama psicológico com alguns momentos de tensão, nas mãos do diretor James Wan (Jogos Mortais) se torna uma montanha russa sangrenta de perseguições em busca vingança. A trama escrita pelo escritor de Desejo de Matar (a maior saga de vingança familiar do cinema!) não dá trégua para o espectador. Apesar de abusar dos velhos clichês hollywoodianos, nos compensa por contar com cenas memoráveis (geralmente violentas) e pequenas reviravoltas que dão fôlego para o filme crescer num final que não desaponta.


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26 de janeiro de 2008

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ASSÉDIO
(Besieged, 1998)
de Bernardo Bertolucci

Assédio nos traz um Bertolucci especialmente inspirado e em sua melhor forma. Elegante nos sentidos, conciso em palavras, rico em cores e magistral em concepção, o filme atinge um nível de perfeição raro no cinema autoral contemporâneo. Sua câmera e sua edição nos surpreendem a cada tomada e a cada corte. O encadeamento das cenas é como um rico bordado alinhavado com cores, sons, objetos e texturas.

O filme pode ser visto como a radiografia do crescimento de um amor. Adicionalmente, e por não se conformar com apenas isso, Bertolucci introduz alguns toques sócio-políticos, ao abordar a difícil situação de algumas comunidades africanas.

Com extrema sensibilidade, ele procura, com sua conhecida maestria, usar a música, o corpo, a troca de olhares, ao invés do diálogo, para passar sua mensagem ao espectador. Composições clássicas de Mozart e Bach se conjugam com o inspirado sax de John Coltrane e com uma seleção de ritmos africanos.

Além da magnífica direção de câmera e da fantástica seleção de músicas, "Assédio" conta ainda com um ótimo roteiro, escrito por Bertolucci e por sua mulher, Clare Peploe, com o competente design de produção de Gianni Silvestri, com a bela fotografia de Fabio Cianchetti e com as grandes atuações de David Thewlis e Thandie Newton.

Assédio vai elaborar todo um discurso a respeito das novas formas de viver, de pensar, as novas modalidades de trabalho, de vínculo social. O filme sinaliza para outros modos de sociabilidade num mundo de populações, imagens e culturas migrantes. Segundo Bertolucci, a idéia era “trabalhar uma dramaturgia sem conflito”.

A impossibilidade do diálogo é central aqui. Um dos únicos momentos em que uma troca de palavras acontece, ao invés de aproximar à africana e o inglês, gera, ao contrário, ódio e indignação. Ele diz, em inglês: “Eu amo você. Vou com você para qualquer lugar. Se você quiser, nós podemos ir à África.” E ela responde, em inglês, empurrando-o para longe: “África? Mas o que você sabe sobre a África?”

No geral trata-se de um filme delicado, contraditório (o que faz dele tão belo) à situação que vai decorrendo;pois há um peso vital que o desejo, o afeto, o querer, o sexo, se fere ao defrontar a história por valores e pré-conceitos quase como que um fantasma imenso e pesado a atormentar vontades, talvez apenas perceptível quando encostado ao amor, porem invisível aos nossos próprios olhos mesmo que sempre invocado por nós mesmos. O filme é intrigante, doce e doloroso...


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19 de janeiro de 2008

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ENTRE O CÉU E O INFERNO
(
Black Snake Moan, 2006)
de Craig Brewer

“Blues de alma, mas rock 'n' roll em atitude, “Black Snake Moan” parece a princípio mais um exemplar de cinema conservador raivoso travestido de filme “pulp”, mas vai além numa cena espetacular”. Bernardo Krivochein.

A história no começo pode soar mais uma obra caricata mergulhada em apelação, mas o diretor e roteirista Craig Brewer (de "Ritmo de Um Sonho") trata de dar à trama sensibilidade, e por mais que risadas de canto de boca possam surgir quando Ricci "devora" os homens, o expectador acaba se sensibilizando com a situação da personagem.

O leque de personagens principais é fabuloso. Samuel L. Jackson vive o pós-trauma do término de um casamento de vários anos, isolado na sua quinta, refugiando-se no álcool e nos blues que outrora faziam dele um homem de significado cultural no seu meio. Christina Ricci com uma espantosa representação tem uma de suas mais ousadas performances. Ela é uma jovem que vê o namorado partir para uma experiência militar e assim se vê privada de todo o conforto emocional que este lhe transmite, regressando a um passado bem presente de distúrbios psicológicos.


“Absorver-nos nessa cultura tão distinta, mas, simultaneamente, tão universal - A cultura do amor - Que não tem margens. Nem nome”. Craig Brewer

E, em “Black Snake Moan”, Brewer arquiteta uma história que nos vai atribuindo, a pouco e pouco, os detalhes que precisamos para a compreender e apreciar. É um filme atípico, com a alma de uma boa canção de blues e que questiona a força do amor. E aborda a necessidade de relações humanas, a necessidade de tranquilidade interior e a necessidade de afirmação em determinado meio. Porque o termo “meio” pode ser mais circunscrito do que se pretende.

“Black Snake Moan” mostra a que veio numa cena espetacular que explode na tela e revela a verdadeira ambição do longa: incapaz de pregar os olhos à noite, Lazarus decide dar mais uma chance a sua guitarra de blues e leva Rae, quase completamente reformada, para o bar que ele freqüenta há sabe-se lá quantas décadas. Lazarus costumava tocar lá, suas performances históricas tendo permanecido só na saudade da comunidade boêmia local por muito tempo. A notícia do retorno de Lazarus ao palco do bar provoca comoção geral: ao contrário de todas as noites, o lugar está lotado. Lazarus e banda começam a tocar e Rae, assim como todos os freqüentadores, dançam como se possuídos. É uma dança sugestiva, erótica, de fazer os conservadores ficar de cabelo em pé. É uma “Dança da Garrafa” ou a coreografia da “Injeção”. Mas Brewer faz desse momento, senão o mais puro, o mais catártico em todo o filme.

"Black Snake Moan" tem vários paralelos com o blues. É uma obra sobre redenção, espiritualidade e amor, em que as pessoas precisam espantar seus "demônios" ou simplesmente seguir em frente e conviver com eles.

Destaque para a trilha sonora, repleta de belas canções de blues.



Trilha sonora:

1 - When The Lights Go Out Escrita por Daniel Q. Auerbach & Patrick J. Carney.Interpretada por The Black Keys.
2 - Lord Have Mercy On me Escrita por Junior Kimbrough.Interpretada por Outrageous Cherry.

3 - Standing In My Doorway Crying Escrita e Interpretada por Jessie Mae Hemphill.
4 - Pass And FailEscrita por Erika
Wennerstrom.Interpretada por The Heartless Bastards.
5 - Mr. Oblivian Escrita por Michael Paul Walker.Interpretada por Eldorado and the Ruckus.
6 - The Losing Kind Escrita e Interpretada por John Doe.
7 - Just Like A Bird Without A Feather Escrita por R.L. Burnside.Interpretada por Samuel L. Jackson e Kenny Brown.
8 - Hate On Escrita por Al Kapone e John Shaw.Interpretada por Al Kapone.

9 - Morning Train Interpretada por Precious Bryant.
10 - Chicken Heads Escrita por Bobby Rush e Calvin Carter.Interpretada por Bobby Rush.
11 - Catfish Blues Escrita por Robert Petway.Interpretada por Samuel L. Jackson.
12 - Jack's Blues Escrita e Interpretada por Big Jack Johnson.
13 - Catfish Medley Interpretada por Samuel L. Jackson e Big Jack Johnson.

14 - Jesus On The Mainline Interpretada por Tate County Singers.
15 - Granny, Do Your Dog Bite? Escrita por Otha Turner.Interpretada por Otha Turner e The Rising Star Fire & Drum Band.
16 - Lonesome In My Home Escrita e Interpretada por Junior Kimbrough.
17 - A Town With No Shame Escrita e Interpretada por Jimbo Mathus.
18 - Old Black Mattie Escrita e Interpretada por R.L. Burnside.
19 - All I Need Is Some Sunshine In My LifeEscrita por W. Dean Parker.Interpretada por The Dixie Nightingales.
20 - Black Snake Moan Interpretada por Samuel L. Jackson and Jason Freeman.
21 - Balm In Gilead Interpretada por S. Epatha Merkerson.
22 - My Baby Got Drunk Escrita e Interpretada por Paul "Wine" Jones.
23 - Alice Mae Escrita por R.L. Burnside e Kenny Brown.Interpretada por Samuel L. Jackson, Kenny Brown e Cedric Burnside.
24 - Stackolee Interpretada por Samuel L. Jackson, Kenny Brown, Luther Dickinson e Cedric Burnside.
25 - This Little Light Of Mine Interpretada por Christina Ricci e Alvin Youngblood Hart.
26 - Mean Ol' Wind Died Down Escrita por Luther Dickinson.Interpretada por North Mississippi Allstars.

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