(Memento, 2000)
de Christopher Nolan
"Memento" é refinado quebra-cabeça que exige memória e concentração do espectador.
Fernanda Russomano (Londres)
Memento é um filme do tipo conceitual. Daqueles que se prendem a uma idéia de roteiro e constroem toda a obra em torno e dependentemente dessa característica.
Com um enredo extremamente bem amarrado, o filme conta a história de Leonard Shelby, belissimamente interpretado por Guy Pearce, que sofre de perda parcial de memória devido a uma pancada que levou na cabeça do criminoso que estuprou e matou a sua esposa. Ele está a procura deste assassino que arruinou a sua vida. Como não consegue lembrar de nada por mais de alguns minutos, Leonard faz anotações de tudo o que vê, ouve e até das coisas mais rotineiras, como fazer a barba. Sua memória é registrada em fotos Polaroid e as mais cruciais são tatuadas em seu corpo, muitas vezes por ele mesmo.Durante esta desesperada busca, ele conhece o ambíguo Teddy (Joe Pantoliano), e a "barwoman" Natalie (Carrie-Anne Moss).
É verdade que "Memento" sofre do vício daqueles filmes em que as personagens (e, com elas, o espectador...) sabem de menos — é que nesses casos, o realizador sabe demais, e é difícil resistir à tentação do jogo e da manipulação.
O ritmo rápido das cenas em preto e branco torna "Memento" ainda mais intrigante e nos obriga a exercitar a nossa memória. Mostram o passado de Leonard antes do incidente e também são peças essenciais para a montagem deste filme "quebra-cabeça". "Memento" exige uma grande concentração.
O que falar da trilha sonora, que é muito bem utilizada, aparece nos momentos certos e é extremamente envolvente. E, principalmente, é preciosa na construção do ambiente depressivo que Christopher Nolan nos apresenta. E ajuda-nos a perceber que o filme, mais que um thriller, é um genial drama existencial.
As imagens que Cristopher Nolan nos oferece, em Memento, fazem lembrar as notas de uma qualquer melodia que não reconhecemos de imediato, quando a sua composição é ligeiramente alterada. Com o encadeamento inteligente e sedutor de ideias, a coerência entre a mente do espectador e o declarado desfile de epicentros psicológicos presente, podemos afirmar que, a Memento, só falta mesmo o que dele podemos sentir.
E é esse o desafio que nos é colocado. Sabemos o que aconteceu (o início do filme dá-nos a conhecer como termina), e não o que vai acontecer. Como se contemplássemos a perfeição e o jogo de cores presente na pintura de um quadro, não perdendo depois o entusiasmo, ao tentar perceber os motivos físicos e emocionais que levaram o pintor a criá-lo.
Memento torna-se, nesse sentido, num dos trabalhos mais estimulantes sobre a capacidade e o significado da memória de um ser humano e da rotina desse pensamento.
Nós, enquanto indivíduos, podemos decidir “esquecer” algo que não nos agrada, algo com que não nos queremos confrontar. O início e final de “Memento” são, por isso, particularmente chocantes, não tanto no que mostram, mas pela forma como questionam e jogam com as nossas certezas e, principalmente, pela forma como constatamos, em toda a sua dimensão, o destino cruel da personagem principal. No fundo, a ambíguidade de acreditar naquilo que queremos… Hitler também pensou o mesmo, com os resultados que se conhecem. A existência do anjo da morte loiro que Pearce encarna com tanta bravura não anda muito longe…
... Cuspido por Raphael, e informações adicionais IMDB e Cine Players .
LUZ , CÂMERA , AÇÃO ...CORTA.